Um
lixo de vida
Uma
amiga querida trabalha na vigilância sanitária e outro dia ela me falou que
houve uma denúncia de que havia carne envenenada no aterro e que até os urubus
que haviam comido morreram.
Para
muitos o parágrafo acima pode parecer banal e sem lógica, afinal qual o
problema de se jogar carne envenenada no lixo? O aterro é um grande amontoado
de lixo, e isso não deve fazer diferença alguma!
Mas,
faz uma IMENSA DIFERENÇA para quem sobrevive do lixo!
Longe
dos olhos de muitos, há gente como a gente que vive do lixo! Gente que recolhe aquilo
que julgamos imprestável. Triste, né?!
Mas,
há gente que se alimenta, se veste e sobrevive no lixo e do lixo.
Quando
citei acima as palavras “se alimenta” é porque eles literalmente comem os
alimentos que encontram no aterro, comem o que foi descartado e é por isto que
o pessoal da vigilância sanitária se preocupa tanto com estes tipos de
descartes, porque mesmo sem saber as pessoas podem morrer comendo algo assim.
Quando
um alimento vence em nossa casa, nós jogamos fora. Afinal jamais comeríamos
algo assim! Mas, e se eu te disser que muitas vezes este alimento chega ao
aterro (levando em consideração as variações de temperatura e o próprio
transporte, nada higiênico dos carros coletores de lixo) e que ele é
aproveitado por homens, mulheres, crianças e idosos!
Difícil
acreditar, né? Eu sei que é difícil até de imaginar que isso pode acontecer,
mas acontece todos os dias nos aterros mundão afora!
Essa
mesma amiga falou que ao conversar com um dos catadores sobre o risco de
ingerir estes tipos de alimentos ele sorriu e falou:
-
Mas, a gente não come quando tá envenenado não! A gente viu que até os urubus
morreram! Mas, o melhor mesmo é quando vem o lixo dos supermercados, porque vem
até congelado! A gente enche o bucho e fica forte e feliz!
Quero
deixar a seguinte pergunta para vocês, caros leitores: Como se sentem sabendo
que um semelhante vive assim?
Sabe
o que é mais contraditório, é que minha amiga falou que havia felicidade nos
olhos dele. Mesmo com tanta dificuldade e privação ele era feliz, animado!
Brincava enquanto catava o seu lixo de cada dia!
Este
homem nos dá uma lição não só do que é felicidade, mas do quanto somos pequenos
e cegos. Somos cegos para o sofrimento alheio e ingratos, reclamamos na mesma
proporção do que possuímos. Quanto mais possuímos, mais estamos insatisfeitos e
infelizes. Quem será que tem um lixo de vida, ele ou nós?
Eu
já visitei um aterro e é uma lição de vida, aconselho os caros amigos a irem
também. Vão e levem seus filhos, mostrem uma realidade que existe e resiste
sofridamente. A compaixão pode e deve ser ensinada, é uma forma de semear um
amanhã melhor.
No
aterro tem muito lixo, óbvio! Mas, tem muita gente boa também! Gente que não
perde a fé e nem a alegria. Gente que brinca e ri da sua própria desgraça
tornando assim o não só o seu fardo mais leve, mas aliviando o nosso também,
mostrando-nos que nossos problemas são insignificantes diante do que eles vivem.
Eu
acho até que para Deus este tipo de gente são como flores de lótus, elas vivem
na sujeira do egoísmo da humanidade que permite que seus irmão vivam sobre
condições péssimas enquanto outros roubam descaradamente o que deveria
alimentar os necessitados.
Luciene
Linhares
29
de Janeiro de 2015