sábado, 28 de julho de 2012

Compaixão anestesiada




Compaixão anestesiada

O curso de enfermagem me ensinou muitas coisas, além das técnicas específicas da área, eu aprendi a observar o ser humano de uma forma diferente. O período de estágio que passei na UTI de um hospital, me colocou frente a frente com o que havia de melhor e de pior no ser humano.
Sentimentos como solidariedade, compaixão e amor estão sempre presentes. Embora a imagem passada seja ruim, pela gravidade da situação que cerca uma UTI, há lugar para a demonstração de afeto gratuito, tanto de funcionários quanto de paciente e seus respectivos familiares. É um lugar onde a vida luta bravamente para se manter,  acompanhada de perto pela fé e esperança e cuidados dos que a assistem.
Conheci muitas pessoas que até o último momento foram exemplos de paciência, coragem e amor. Mas, como bem sabemos, há pessoas que levam o título de profissionais pelo simples fato de possuírem um diploma, mas que não os horam como deveriam. Pessoas incapacitadas tanto profissionalmente como psicologicamente e espiritualmente.
Tomando como base o lema da enfermagem que é “a arte de cuidar”, pergunto-me todos os dias como alguns profissionais conseguem dormir tranquilamente à noite sabendo que não horam seu compromisso fundamental, que é cuidar. Presenciei uma cena que marcou o meu estágio e também a minha vida. Eu estava checando a pressão de um velhinho muito debilitado, quando percebi que ele havia defecado na fralda, como era estagiária, não sabia onde se encontrava todo o material para a limpeza e tinha que solicitar ajuda da enfermeira do plantão, então comuniquei sobre o estado do velhinho e a mesma olhou para o relógio e viu que faltavam 45 minutos para terminar o seu plantão, ela com uma risada de deboche me disse para deixar a troca de fraldas para o próximo plantão e saiu para a bancada onde se envolveu em uma conversa animada sobre uma festa que havia acontecido na noite anterior.
Como um ser humano consegue ser tão insensível a dor do outro?
Que “morfina” é esta que anestesia os sentimentos?
Isto, se ela tiver sentimentos, coisa que também comecei a duvidar. E se fosse um parente dela, será que ela agiria desta forma? Claro que não, se fosse um parente dela, ela moveria céus e terra para que fosse bem tratado, abusando de seus contatos na área para melhor acompanhar, talvez se certificando de que “profissionais” como ela não chegassem perto de seu parente.
Mas, como a dor é do outro, o que outro que se vire com sua dor.
Algumas pessoas se guiam pela teoria de que, com o passar dos anos, alguns profissionais da área de saúde, ficam insensíveis ao sofrimento dos pacientes, além de não servir como justificativa, eu não creio que exista este tipo de anestésico para a alma, a compaixão não se permite anestesiar, assim como não dá pra fingir o que não se sente por muito tempo."
Conversa de Passarinho 

28 de Julho de 2012